O Carmelo é Jovem – Caminhos de Santidade a partir de encontros de Jesus com os jovens

Frei Luiz Otavio da Silva, O. Carm.

“Jesus, o eternamente jovem, quer nos dar um coração sempre jovem,”1 diz o Papa Francisco na Christus Vivit. Vestir-se do homem novo, como nos convida a Sagrada Escritura,2 é renovar em nós a juventude através de sentimentos de compaixão, bondade, humildade, mansidão, paciência; suportando-nos uns aos outros e perdoando-nos mutuamente.3 Isso significa amar. Ao mesmo tempo em que tudo o que nos separa dos outros nos envelhece.4

O Carmelo é uma escola de oração que tem Nossa Senhora como mãe e mestra, uma jovem que acolheu sua missão e vocação e concebeu o filho de Deus. Sua missão foi tao intimamente ligada à de Jesus que ela esteve presente desde sua encarnação, vida e missão, em sua morte e ressurreição e até depois de sua ascensão, como mãe da Igreja. Maria é aquela que guarda e medita os mistérios da vida de seu filho em seu coração sempre jovem. E é na vida de Jesus que encontramos o tesouro de seus encontros com os jovens, os quais, a luz da vida de muitos santos carmelitas, tornam-se caminhos de santidade que devemos, a exemplo de Maria, guardar no coração e meditar constantemente; a fim de renovar em nós o frescor e o amor, a juventude de nossa vocação.

Jesus valoriza e acolhe os jovens.

No Evangelho de Lucas houve uma discussão entre os discípulos para saber qual deles seria o maior. Jesus então declara que “o maior entre vós se torne como o mais jovem”.5 O termo usado aqui é neóteros (νεώτερος), que significa literalmente “mais jovem” ou “o mais novo”. No tempo de Jesus, crianças e jovens eram vistos como socialmente irrelevantes. Com exceção de figuras como José, Daniel e outros, em geral a maturidade era considerada a idade em que a pessoa possuía sabedoria, status social, bens materiais, poder. Mas Jesus não apenas acolhe os jovens — Ele os coloca no centro como modelo de vida no Reino. No Carmelo de Los Andes, em 1919, com 19 anos de idade, entra no Carmelo Juana Fernández Solar, Santa Teresa de Jesus dos Andes. Sua breve passagem pelo mosteiro, com duração de apenas 11 meses, foi marcada por grande fervor e amor a Deus, deixando um profundo legado espiritual, sendo reconhecida pela Igreja como a primeira santa chilena e a primeira carmelita latino-americana a ser canonizada. Ela foi jovem, porém de uma grande santidade e envergadura espiritual, encarnando em sua vida as palavras de Jesus e nos dando um rico modelo de juventude a ser seguido.

Jesus também escuta as inquietações e sonhos dos jovens.

O Evangelho de Marcos nos apresenta uma pessoa que, quando Jesus lhe recorda os mandamentos, diz: “Senhor, tudo isso eu tenho observado desde a minha juventude.”6 Mas mesmo sendo fiel na sua juventude, aquele homem rico deixara-se envelhecer física e espiritualmente, pois os anos lhe haviam roubado os sonhos e ele agora preferia viver apegado a seus bens, a garantias materiais.

E no Evangelho de Mateus um jovem se aproxima de Jesus com uma pergunta profunda: “O que devo fazer para ter a vida eterna?”. O Senhor escuta, propõe e convida a dar um passo além: “… vai, vende o que possuis e dá aos pobres… Depois vem e segue-me.”7 Aqui aparece o termo grego neaniskos (νεανίσκος – jovem adulto de 20 a 30 anos). Porém, mesmo jovem fisicamente, aquele rapaz já havia renunciado a juventude de sua vocação. Ele vai embora triste e apegado a bens que não podiam dar-lhe a felicidade.

O jovem católico também carrega perguntas: sobre sentido da vida, vocação, justiça, fé. Jesus não oferece respostas superficiais, mas um caminho exigente de amor radical. O risco é, como o jovem rico, prender-se ao conforto e às seguranças e ir embora triste. Nesse sentido o Carmelo nos presenteou com Santa Teresa do menino Jesus, que desde a juventude aspirava a uma vida mais próxima de Nosso Senhor Jesus Cristo, desejava junto com a irmã, Paulina, ser uma eremita e viver no deserto em profundo estado de contemplação e intimidade com Deus. Elas até chegaram a fazer uma “cela” improvisada no jardim de sua casa em Lisieux para brincarem de eremitas. Quando Paulina, anos mais tarde, entra no Carmelo, ela diz a Teresinha: “encontrei no Carmelo o deserto que buscávamos”.8 E ainda nesse sentido, Teresa de Los Andes é novamente um modelo que incorpora os valores evangélicos. Ela vinha de uma família chilena rica e abastada, porém renunciou toda aquela riqueza para abraçar sua vocação de maneira generosa, dedicando-se com intensidade às tarefas mais simples do mosteiro, como por exemplo limpar a casa.

Jesus caminha com os jovens nas suas dores.

No Evangelho de Marcos um menino, paidion (παιδίον), é trazido a Jesus para que fosse curado de um espirito mudo (pelos sintomas tratava-se de epilepsia). Aquele jovem desde cedo conhecia o sofrimento e é pela pequena fé de seu pai que ele é levado a Jesus, o qual se compadece dele, curando-o.9 Em Lucas, Jesus entra em uma cidade e comove-se com as lágrimas de uma mãe viúva que chora a morte de seu filho. Ele dirige-se ao morto dizendo: “Jovem, a ti te digo, levanta-te.”10O termo grego aqui é novamente neaniskos (νεανίσκος), e um jovem é trazido por Jesus da morte para vida e põe-se então a falar. Ambos os milagres libertam os jovens do sofrimento fazendo-os falar, uma clara alusão ao anúncio do Reino de Deus e o convite a conversão, cerne da missão de Jesus e da Igreja.

A juventude de hoje também conhece o sofrimento: doenças, opressões, feridas emocionais, realidades familiares difíceis. Jesus não ignora essas dores, mas se aproxima, toca e devolve a vida. O jovem católico é chamado a deixar que Jesus cure suas feridas e, ao mesmo tempo, ser instrumento de cura para outros — especialmente em um mundo ferido por depressão, solidão, ansiedade e falta de esperança. O Carmelo nos dá o grande exemplo do Beato Isidoro Bakanja, um leigo e pedreiro católico congolês que sofreu o martírio em 1909 aos 24 anos de idade. O motivo do martírio foi sua recusa em obedecer às ordens de seu empregador, um colonizador belga, que o mandou abandonar sua fé cristã, removendo o escapulário e parando de pregar. Isidoro foi espancado e torturado por se recusar a renunciar à sua fé. Ainda muito jovem, ele conheceu o peso do sofrimento e da injustiça, mas viveu sua dor unido a Nosso Senhor Jesus Cristo, transformando suas feridas em testemunho de fé, como os jovens do Evangelho que encontram em Jesus a fortaleza diante da aflição.

Jesus chama para a missão agora, com o aquilo que o jovem possui, sem esperar “ficar pronto no futuro”.

No Evangelho de Joao um menino é trazido por André a Jesus. Ele tinha cinco pães de cevada e dois peixinhos, algo aparentemente insignificante diante da quantidade de pessoas que havia ali para ser alimentada, aproximadamente cinco mil homens, sem contar mulheres e crianças. O menino não tinha muito, mas colocou o pouco que tinha nas mãos de Jesus, e isso bastou para alimentar uma multidão.11 Hoje o convite de Deus é: não espere ser perfeito ou ter tudo para servir. Deus multiplica o pouco que você oferece — seja seu tempo, talentos ou criatividade — para transformar vidas.

O Papa Francisco nos ensina que o jovem católico não é apenas “o futuro”, mas o “agora” da Igreja.12 Jesus espera a fé simples, a abertura e a alegria típicas da juventude. E o Jubileu é um convite para reconhecer o valor e o protagonismo do jovem na missão da Igreja.

Um grande exemplo de uma jovem carmelita que se dedicou com aquilo que tinha ao amor a Deus e o cuidado do próximo pode ser encontrado na Beata Candelária de São José, Zuzanna Paz-Castillo Ramírez (1863 – 1940), uma venezuelana de família pobre, porém respeitada e piedosa, que aos 16 anos de idade começou a cuidar de enfermos, sobretudo sobreviventes da revolução liberal, muitos deles inválidos por mutilações, órfãos, pessoas de idade avançada e toda sorte de necessitados. Ela não possuía grandes recursos para cuidar das pessoas, mas em sua pobreza utilizou aquilo que tinha em mãos para fazer o bem. Ela aprendera com o pai, descendente de indígenas, como utilizar remédios naturais, e era com esse tipo de medicação que tratava dos enfermos em enfermarias improvisadas. Deus honrou a dedicação de Suzana, levando-a mais tarde a tornar-se a gerente do hospital Santo Antônio e ao estabelecimento da Congregação das Irmãs Pobres de Alta Gracia. Mais tarde Suzana tomaria o nome Candelária de São José.

Jesus convida a uma fé corajosa. No Evangelho de Marcos, no momento da prisão de Jesus, seus discípulos o abandonam e fogem todos. Os guardas, então, tentam agarrar um jovem que o seguia e vestia apenas um lençol enrolado no corpo, mas esse jovem deixa ali o lençol e foge nu.13 Esse pormenor só existe em Marcos, e muitos comentadores entenderam que esse jovem seria o próprio evangelista. Ele seguiu Jesus de perto, mas no momento do perigo, fugiu. É um retrato da fragilidade humana e do medo.

Em um mundo que desafia valores cristãos, o jovem católico é chamado a permanecer firme e não ter vergonha de sua fé, mesmo sob pressão ou perseguição. O Carmelo nos oferece vários testemunhos de jovens que viveram uma fé corajosa e autêntica, como é o caso do acima mencionado mártir Beato Isidoro Bakanja. Outros mártires não foram mortos durante sua juventude, como São Tito Brandsma, mas demonstraram desde a jovens a intrepidez e a coragem de anunciar sua fé sem medo e sem se dobrar diante dos poderes injustos desse mundo. Brandsma não hesitou em ser fiel a verdade mesmo diante da prisão e dos sofrimentos no campo de concentração. E nem mesmo a morte pôde separá-lo do Cristo a quem amava e em cujo obséquio viveu.

Em conclusão, o Carmelo, em sua tradição de oração e testemunho, mostra que a juventude não é apenas uma fase da vida, mas uma atitude espiritual: manter o coração aberto ao amor e à novidade (evangelho) de Deus. No entanto, não se trata de cultivar um “culto à juventude” ou negar o valor das outras etapas da vida. A Igreja é chamada a promover o diálogo entre gerações que juntas constroem uma comunidade viva e fiel ao Evangelho. Assim, o Carmelo é jovem porque se renova em cada geração; ele rejuvenesce em cada coração que se deixa transformar por Cristo e, a exemplo de Maria, nossa Mãe, Irmã e Mestra, vive em seu obséquio, com coração puro e reta consciência.


  1. Christus Vivit, 13 ↩︎
  2. Cl 3,9.10 ↩︎
  3. Cl 3,12-13 ↩︎
  4. Christus Vivit 13. ↩︎
  5. Lucas 22, 26. ↩︎
  6. Mc 10, 20. ↩︎
  7. Mc 10, 20. ↩︎
  8. Autobiografia de Santa Teresinha do Menino Jesus, Manuscrito A, capítulo II. ↩︎
  9. Mc 9,17-27 ↩︎
  10. Lc 7,11-15. ↩︎
  11. Jo 6,9 ↩︎
  12. Christus Vivit, 178. ↩︎
  13. Mc 14, 51-52. ↩︎

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