Painéis coloniais e a devoção a N. S. do Carmo
A Igreja do Carmo de João Pessoa/PB, abriga um acervo de azulejos, 10 painéis ao todo, datados da segunda metade do século XVIII, nos quais representa iconograficamente passagens e personagens ligados à história do Carmelo. No ano de 2015, o professor e doutor em história, o cearense André Cabral Honor, escreveu, pela editora Fino Traço, o Catálogo de azulejaria da Igreja do Carmo.
Deste catálogo, com autorização do autor, apresentamos três painéis com suas respectivas explicações. O primeiro apresenta N. S. do Carmo como protetora da Ordem; o segundo apresenta a figura de “São Simão Stock”; o terceiro, Nossa Senhora resgatando as almas do purgatório. Estes painéis eram meios pelos quais se transmitia a fé e a devoção à N. S. do Carmo.
Iconografia
No presente painel, ajudada por anjos e usando uma coroa de rainha, Nossa Senhora do Carmo estende seu manto sobre os frades (membros da ordem primeira) e monjas (membros da ordem segunda) da Ordem Carmelita. O manto é uma alegoria de proteção: quem conseguir se espelhar nos modelos de virtude cristã estará protegido pela mãe de Cristo. A ideia é que o católico que se encontra sob a proteção do manto de Maria esteja plenamente identificado com a cultura carmelita, adotando Nossa Senhora do Carmo como matrona e guia espiritual.
Na parte inferior é possível identificar uma torre ou um castelo. Sua imagem também está associada à ideia de proteção dentro da doutrina cristã, mais especificamente, à obediência aos preceitos místicos de Santa Teresa de Jesus que utiliza essa imagem no seu livro Castelo interior para exemplificar suas ideias. Na parte superior, a iconografia de um espelho surge como um dos símbolos marianos identificando-se com o feminino. Assim como a lua reflete a luz do sol, Nossa Senhora projeta a vontade de Deus ao aceitar conceber seu filho.
Curiosidade
A imagem da torre, assim como do espelho, são símbolos marianos extremamente fortes dentro da cultura cristã por estarem citados na ladainha de Nossa Senhora, oração difundida desde a Idade Medieval.
Iconografia
A identificação de uma das personagens desse painel é motivo de discussão. O frade que se encontra mais próximo à Nossa Senhora possui um nimbo (espécie de luz que fica em torno da cabeça de algum santo) diferenciando-o dos demais carmelitas presentes no painel. Acredita-se tratar de São Simão Stock, frade responsável por difundir a Ordem de Nossa Senhora do Carmo na Inglaterra.
Quando já era frade carmelita, em uma de suas visões de Nossa Senhora, São Simão Stock recebeu das mãos da Virgem o escapulário, que rapidamente foi incorporado à indumentária da Ordem do Carmo. Nossa Senhora teria dito a São Simão Stock que ela salvaria pessoalmente do fogo eterno aquelas pessoas que na hora de sua morte estivessem usando o escapulário.
As cartelas indicam a presença de Deus, seja por meio da água, fonte da vida, pois como é dito no Evangelho de São João, “quem beber da água que lhe darei, nunca mais terá sede. Pois a água que eu lhe der tornar-se-á nele fonte de água jorrando para a vida eterna”, ou por meio dos girassóis, que acompanham o trajeto representando o amor de Deus.
Curiosidade: Junto a Nossa Senhora do Carmo há uma figura angelical que pode ser identificada como São Miguel Arcanjo. Para a tradição Católica, arcanjos são anjos com funções e nomes atribuídos. (…) Cada um possui uma função específica. No caso de São Miguel, ele é responsável por pesar os pecados das almas, o que decidirá se o homem irá para o paraíso, inferno ou purgatório. Essa ligação direta com a salvação e a condenação aproxima-o de São Simão Stock e do Escapulário.
O painel é uma representação de Nossa Senhora do Carmo salvando as almas do purμlórlo. Maria, com o menino Jesus em seus braços e rodeada por nuvens e anjos, estende a mão para um homem que usa o bentinho já difundido nessa época como substituto do escapulário – enquanto que o menino Jesus também estica seu pequeno braço para outra personagem. Ao seu redor, homens e mulheres olham para a Virgem do Carmo. Todos portam o escapulário, e o fogo, que antes os consumia, parece se afastar de seus corpos, como se bastasse apenas a presença de Nossa Senhora e seu Filho para que a dor e o sofrimento tivessem fim.
As imagens das cartelas do painel reafirmam a ideia de imortalidade e ressurreição. Na parte inferior, uma árvore faz a ponte entre o mundo terreno e o plano divino, pois ao portar o escapulário em vida o cristão garante a salvação eterna. Nesse sentido trata-se de uma ressurreição, em que o homem (..) é resgatado por Nossa Senhora. Na parte superior, uma fonte representa a água da vida, usada também como símbolo de purificação física e moral.
Curiosidade
De acordo com a tradição carmelita, aquele que morrer usando o escapulário será resgatado por Nossa Senhora no purgatório no primeiro sábado após a sua morte.