Leigos Carmelitas: artífices de um mundo novo1

1- Os leigos

“Os FIÉIS LEIGOS pertencem àquele Povo de Deus que é representado na imagem dos trabalhadores da vinha, de que fala o Evangelho de Mateus: “O Reino dos Céus é semelhante a um proprietário, que saiu muito cedo, a contratar trabalhadores para a sua vinha. Ajustou com eles um denário por dia e mandou-os para a vinha” (Mt 20, 1-2).

A parábola do Evangelho abre aos nossos olhos à imensa vinha do Senhor e à multidão de pessoas, homens e mulheres, que Ele chama e envia para trabalhar nela. A vinha é o mundo inteiro (cf. Mt 13, 8), que deve ser transformado segundo o plano de Deus em ordem ao advento definitivo do Reino de Deus”.  (Christifideles laici, 1.1,2)

“Vocês são a luz do mundo” (Mt 5,14)

É imprescindível o papel dos leigos na missão da Igreja. O apostolado que estão chamados a desempenhar, e que surge de sua própria vocação cristã e de seu compromisso batismal, nunca pode faltar na Igreja.

Os cristãos leigos são chamados a viver seu compromisso temporal carregando em sua bagagem de vida a misericórdia de Deus, para incendiar o mundo com as labaredas da paz. São o rosto vivo de um novo Pentecostes, o povo da Nova Aliança, unido na certeza de que somente Jesus Cristo, o Filho de Deus, nossa paz, pode mudar o coração das pessoas. São as sentinelas da paz nos lugares onde vivemos e trabalhamos, os guardiões deste mundo que vigiam para que as consciências não cedam à tentação do egoísmo, da mentira e da violência. Sem eles a paz de Cristo que a Igreja guarda não penetraria no mundo e seria pura utopia.

2- Os leigos carmelitas

Dentro da vocação batismal comum, alguns leigos são chamados a participar do carisma de alguma família religiosa em particular. A profissão ou consagração como leigo carmelita, pela recepção do escapulário ou hábito carmelita, é uma profunda renovação das promessas batismais.

A incorporação dos leigos na Família Carmelitana se realiza mediante a instituição da Ordem Terceira. Trata-se de homens e mulheres chamados a viver o carisma carmelitano no mundo, santificando totalmente sua atividade cotidiana mediante a própria fidelidade às promessas batismais.

Em alguns lugares do mundo, os membros da Ordem Terceira são simplesmente conhecidos pelo nome de “leigos carmelitas”, embora este termo compreenda muitos outros grupos e realidades. Em vários países existem Irmandades e Confrarias muito antigas, sem esquecer os milhares de milhares de pessoas que usam o Escapulário de Nossa Senhora do Carmo.  Há muitos novos grupos que estão florescendo em distintas partes do mundo, entre os quais destacamos o JUCAR (Juventude Carmelitana) e o INCAR (Infância Carmelitana). Estes novos grupos testemunham a energia criativa que há dentro da Ordem. O carisma carmelita tem inspirado muitas pessoas no mundo para viver profundamente o Evangelho, e, às vezes, de modo heroico. 

Estes irmãos e irmãs, os quais o Escapulário e o sentido de pertença unem a tantos outros membros da Ordem Carmelita, são partícipes do mesmo dom e devem ser fiéis, em todas as circunstâncias, aos deveres provenientes dessa pertença carismática, sem conformar-se com uma prática cristã superficial, mas correspondendo ao seguimento radical de Cristo, que chama os seus discípulos a ser perfeitos como o Pai Celeste é perfeito (Mt 5,48). À semelhança dos frades, freiras e monjas, têm uma verdadeira vocação e um testemunho do carisma carmelita para os demais.

2.1- O carisma carmelita

Os elementos fundamentais do carisma carmelita são bem conhecidos: oração, fraternidade e serviço. Estes três elementos são unidos pela contemplação. Antes de qualquer coisa, os Carmelitas são chamados a seguir a Jesus Cristo e a viver o evangelho na vida diária. Para seguir a Cristo, nós nos inspiramos nas figuras bíblicas dos profetas Elias e Eliseu, e da virgem Maria.

O leigo deve viver o carisma como leigo. Jesus não pediu ao Pai que tirasse os seus discípulos do mundo, mas que os livrasse do maligno (cf. Jo 17,15).

A oração

Ao entrar na Ordem eles participam do carisma carmelita, o qual está marcado profundamente pela oração. Portanto, a oração, quer litúrgica ou pessoal, é uma parte integrante da vida do leigo carmelita. A participação diária, se possível, na Celebração Eucarística é a fonte da vida espiritual e dos frutos apostólicos. O Ofício Divino, como participação na oração de Cristo, é recomendado para o leigo carmelita e é também uma fonte de grande ajuda no seu caminho espiritual. A oração pessoal é vital, e os modos de oração fundados na tradição carmelitana, sobretudo a Lectio Divina (leitura orante da Palavra de Deus), são uma fonte de inspiração. A devoção à Virgem Maria é um sinal concreto do leigo carmelita, já que ela é Mãe do Carmelo.

A fraternidade

A fraternidade é também um elemento essencial do carisma carmelita. Os leigos carmelitas podem formar comunidade de muitos e diferentes modos: em suas próprias famílias, onde devem fundar a igreja doméstica; em suas próprias paróquias, onde oram a Deus em união com os demais paroquianos e onde tomam parte nas atividades pastorais; em suas comunidades de leigos carmelitas, nas quais encontram apoio para o caminho espiritual; em seus lugares de trabalho e onde vivem.

O serviço

Como todos os Carmelitas, o leigo é chamado ao serviço, que é, também, uma parte integrante do carisma carmelita dado à Ordem por Deus. Os leigos têm a missão de transformar a sociedade, e podem fazer isso de diferentes maneiras, de acordo com suas possibilidades. O grande exemplo para a ação profética é Elias, cuja atividade teve como fonte uma profunda experiência de Deus. A vocação do leigo carmelita é precisamente esta: a transformação do mundo, a partir de dentro, segundo plano divino da salvação.

A contemplação

A contemplação é o que une todos os elementos do carisma. Como todos os membros da Família Carmelita, os leigos carmelitas são chamados a crescer em sua própria relação com Cristo, até que se tornem seus amigos íntimos. As coisas que ajudam à contemplação estão geralmente ausentes deste nosso mundo, que está marcado por uma atividade frenética. Portanto, os leigos devem buscar, fora do tempo que dedicam às obrigações da vida diária, momentos que lhes permitam falar com Deus no silêncio dos seus corações. Fortalecidos por este alimento, poderão continuar seu caminho e olhar o mundo com olhos novos. Os contemplativos podem ver Deus nas diferentes situações; Ele sempre nos precede em cada situação, antes de que esta aconteça. É dever nosso descobrir a presença de Deus nas situações que nos rodeiam e proclamá-la aos irmãos e irmãs.

2.2- O Desafio

Ser leigo carmelita é uma maneira de viver a própria vida, é uma vocação. Por essa razão, é essencial uma boa formação como acontece com os outros membros da Ordem. O principal desafio que encontrarão é traduzir os elementos do carisma carmelitano na vida diária.

Em sua carta para o Ano Carmelita Mariano, em virtude dos 750 anos do Escapulário, o Papa João Paulo II assinala que o escapulário é essencialmente um “hábito” da Ordem, e a pessoa que o usa deve estar em comunhão com a Ordem e sua espiritualidade. O Escapulário é um significativo símbolo da presença mediadora de Maria, não somente nesta vida, mas na passagem desta para a eterna com Deus. O Escapulário simboliza, por um lado, a maternidade e a proteção de Maria, e, por outro, o nosso compromisso:  Maria é a Patrona, a Irmã e a Mãe dos Carmelitas, e, como tal, cuida de nós; e nós devemos nos esforçar para pôr em prática suas virtudes na vida diária. Consequentemente, a devoção à Virgem vai além de simples recitação de algumas orações, traz o desafio da vivência das virtudes marianas.

O mundo em que vivemos nos apresenta muitos desafios. A estrutura social que sustentava a fé, desapareceu em muitos lugares, e é necessário animar as pessoas em sua opção de seguir a Jesus Cristo. A vocação do leigo, acima de tudo, é ser fermento no coração deste mundo secularizado. Os leigos carmelitas vivem esta vocação inspirados na tradição carmelita. No Magnificat, a Virgem glorifica a Deus porque ela sabe que Deus age transformando a realidade, inclusive ainda quando as aparências sugiram outra coisa. Os leigos carmelitas também estão com Maria aos pés da cruz, cooperando com a misteriosa vontade de Deus, que quer que todos os homens e mulheres se salvem. Vivendo o Evangelho na vida diária, como Maria, nossa Patrona, Irmã e Mãe, os leigos carmelitas têm sua parte na transformação do mundo.

2.3- A Regra do Carmo e a Regra da Ordem Terceira

A Regra de Santo Alberto é um documento carismático que está na origem de qualquer forma de vida carmelita. Neste breve texto, encontra-se em embrião os elementos essenciais do carisma carmelita. Estes elementos foram elaborados nos anos sucessivos e principalmente através da tradição carmelita, enriquecida pela vida de muitas pessoas e, sobretudo, através de nossos santos. Cada pessoa chamada a viver o carisma carmelita contribui de modo especial com a tradição, e esta transmite aos demais.  

A Regra da Ordem Terceira se centra na missão do leigo carmelita, a qual está enraizada no batismo e através do qual cada cristão participa do sacerdócio, da realeza e da missão profética de Cristo. O leigo é sacerdote, profeta e rei tomando parte na vida eclesial e estendendo os benefícios da liturgia na vida diária. Com isto contribui para a santificação do mundo.

2.4- Leigos carmelitas e o seu compromisso com a justiça e a paz

A solidariedade de Jesus com os excluídos de seu tempo, expressa através de sua vida, palavra e ação, e culminada na cruz, nos permite reconhecer sua presença viva nos excluídos de hoje. Já que no “homem das dores, desprezado, que suportou nossos sofrimentos, ferido por Deus e humilhado”, ou seja, no servo de Javé de que nos fala o profeta (cf. Is 52, 13 – 3,12), os primeiros cristãos viram uma descrição antecipada do crucificado (cf. At 8,32; 1Pd 2,21-25; 3,18) também nós somos hoje autorizados a ver no rosto de todos os excluídos, o rosto do próprio Jesus e, à luz de Mt 25, 31-45, considerar que o que fizermos por qualquer um deles, faremos pelo próprio Jesus.

Na realidade, a afirmação do Deus cristão se expressa de forma decisiva através do compromisso com a causa dos excluídos. Aqui se encontra uma profunda motivação teológica deste compromisso em favor da JUSTIÇA E DA PAZ. O núcleo da mensagem de Jesus foi a proclamação da chegada iminente do Reino de Deus como Boa Nova de salvação para os pobres e pecadores, entre os quais se contam os excluídos e marginalizados. O Reino de Deus que Jesus anuncia está essencial e prioritariamente vinculado aos pobres e excluídos. Daí a necessidade do compromisso dos leigos carmelitas com a JUSTIÇA E PAZ nas diversas realidades nas quais estão inseridos.

O Reino de Deus que Jesus proclama está essencial e primordialmente ligado aos pobres e excluídos. Em sua bem-aventurança e libertação, que inclui a superação de sua exclusão, está em jogo a presença do Reino e o destino do próprio Deus encarnado, ou seja, a causa de Jesus na história. Jesus se identifica com eles, que são os destinatários preferenciais de seu Reino, independentemente de sua situação moral subjetiva ou disposição espiritual, e é por isso que percebemos neles, à luz da fé, sua presença contínua entre nós.

BEATO ISIDORO BAKANJA

O mártir do Escapulário é um leigo Carmelita,
o beato Isidoro Bakanja.

  1. Fonte: https://hcarm-orihuela.com/ser-carmelita-hoy/laicado-carmelita/ ↩︎

"Deus é comunicativo" (Sta. M. Madalena de Pazzi, O.C)
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